quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Trocando em Miúdos

Estava ouvindo a música "Trocando em Miúdos" (Chico e Hime), e me dei conta, como nunca antes, de o quanto essa música é triste. Prestem atenção na letra: "Trocando em miúdos, pode guardar as sobras de tudo que chamam lar/A sombra de tudo que fomos nós/As marcas do amor nos nossos lençóis/As nossas melhores lembranças".
 
Olhem para esse trecho e tentem não deprimir-se com ele. O fim de um relacionamento é algo tão duro, tão ruim, que deveria ser proibido por lei. Claro, estou fazendo uma simplificação estúpida, afinal de contas, o fim de relacionamentos envolve inúmeros fatores explícitos e intrínsecos, que juntos culminam no rompimento. Mas convenhamos, o fim de uma relação é uma das coisas mais desagradáveis de que se tem notícia (no campo das emoções, por óbvio). Sempre deixa uma ferida aberta e, posteriormente, uma cicatriz, por vezes, feia e impossível de apagar.
 
Para algumas pessoas até parece fácil. Elas estão sempre começando e terminando relações, como se estivesses apenas trocando de roupa. Mas tenho sérias restrições quanto a isso. Penso que quando há um envolvimento emocional forte e duradouro, é quase impossível ser alheio ao sofrimento causado pela interrupção de um relacionamento.
 
Quando terminamos uma relação, é como se nos separássemos de parte de nós mesmos. São nossos projetos, planos em conjunto, todos rasgados, jogados em uma lata do lixo, já que estes não servem mais para coisa alguma.
 
Trata-se de um processo longo e penoso, onde precisamos reaprender a andar com nossas pernas, sem ajuda de ninguém. As relações são como bengalas, nos escorando quando temos alguma dificuldade. Experimente arrancar a bengala de alguém que precisa dela para se locomover – ou que pensa que precisa dela para se locomover – para ver o que acontece? Um grande tombo. Possivelmente hematomas e escoriações.
Invariavelmente, no fim, o que sobram são lembranças distorcidas, algumas fotos perdidas em um álbum no fundo da estante, e um enorme vazio, antes ocupado por sua cara-metade. Cenários deprimentes que compuseram sua história, mas que foram desmanchados feito um castelo de cartas, restando apenas bagunça e frustração.
 
"Aquela esperança de tudo se ajeitar, pode esquecer/Aquela aliança você pode empenhar, ou derreter..."
 
Me pergunto como o ser humano adquiriu o estranho poder de estragar tudo o que já foi belo um dia? As relação em seu início, salvo raras exceções, sempre tem um caráter de inocência e descoberta, que a tornam vivaz e apaixonante. Em que momento será que as coisas mudam de figura? Qual será o ponto exato em que a inocência acaba e a rotina nos engole sem qualquer pudor? Em que momento termina o amor? Quando termina o encanto?
 
Trocando em miúdos é a melhor síntese sobre o fim de um relacionamento de que se tem conhecimento. Nada exprime tão bem a dor e o vazio que só o fim de uma relação é capaz de produzir. É a descrição mais perfeita de um dos momentos mais tristes na vida de uma pessoa. A morte em vida daquela que, naquele momento, é a sua metade.
 
Por isso, como já dizia Chico: "Eu bato o portão sem fazer alarde/Eu levo a carteira de identidade/Uma saideira, muita saudade/E a leve impressão de que já vou tarde..."

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